Olá, pessoal,
Eu sou o Tomás Queiroz, fundador e game designer da Cordilheira Games, um dos patrocinadores dessa edição do evento, além de ser o jurado responsável por avaliar o Game Design dos jogos dessa edição. Na Cordilheira acreditamos que todos podem criar jogos, por isso mesmo estamos sempre dividindo dicas sobre esse mercado no nosso canal no Youtube, nas nossas aulas, palestras e workshops. Fiquei muito feliz com o convite do Daniel para participar desse evento, pois é mais uma forma de ajudar a comunidade a crescer.
Vai ser um conteúdo extenso, mas fiquem comigo! Acredito que vocês podem tirar algumas coisas bem legais daqui.
Pra começar, quero compartilhar com vocês alguns feedbacks para todos os participantes, alguns focados especialmente em participação em Jam e outros concursos:
*Manual com imagens
Eu entendo que vocês tinham pouco tempo e isso faz parte do desafio da Jam, porém em um jogo de tabuleiro, o manual é peça chave! Não são as cartas, os dados, os componentes, um jogo de tabuleiro é o manual, e se o manual não está claro, se ao terminar de ler a pessoa não sabe como jogar, você ainda não tem um jogo pronto. Por isso recomendo fortíssimo vocês sempre colocarem imagens no manual, isso ajuda muito na compreensão. Lucky Combat - Card Game é um bom exemplo aqui, ele tem um bom manual, ainda fiquei com algumas dúvidas mas faz o manual mais claro da Jam. *Mais sobre isso no feedback específico do jogo.
*Nomeiem seus arquivos
Nós, do júri, precisamos baixar e olhar diversos jogos, e um arquivo com o nome “regras” pode se perder no instante em que o download acaba, por isso nomeie todos os seus arquivos com o nome do seu jogo _ o que é o arquivo. Vida Selvagem, por exemplo, teve arquivos com nomes claros.
*Menos é mais
Um só arquivo com as imagens de print n play e as regras é o ideal, baixar vários arquivos dificulta a organização. Lucky combat também fez isso, todos arquivos em um só documento. COQUETEL fez apenas um documento, bem nomeado que continha as regras e arquivos de impressão, porém as regras ficaram muito subjetivas e não consegui jogar por causa disso.
*Menos tinta!
Não coloque fundo em nenhuma arte, ainda por cima um fundo escuro, isso faz a impressão demorar mais e gasta muita tinta. Senão está servindo uma função no jogo mas for uma questão artística relevante, pode ser interessante fazer uma versão “printer friendly” sem os fundos e outra com os fundos. Alarme Alien é um jogo com muitos componentes, porém com pouca demanda de tinta.
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O que eu procuro em um bom Game Design:
Como jurado na categoria de Game Design, meu trabalho era avaliar os jogos sob essa visão, mas o que diabos eu estava analisando?
Quando eu avalio um jogo, estou procurando um jogo que crie um espaço de decisão interessante. Um espaço de decisão são todas as decisões que eu posso fazer durante um turno e um jogo. Quais são as minhas opções? Como elas se diferenciam? Como elas impactam o estado atual do jogo? Um jogo que cria um espaço de decisão interessante dá diversas opções aos seus jogadores, com diferenças e impactos únicos. Não procuro um jogo com infinitas opções, procuro um jogo em que cada opção seja significativa. E pra quem quer saber mais, eu estendo mais sobre esse assunto nesse vídeo aqui
Agora vamos entrar em feedbacks específicos dos cinco melhores jogos, no quesito Game Design:
5º
Final Boss Fight XXV: United
Game Designer: Igor Moreno
O jogo simula uma batalha final contra o grande chefão de um jogo no estilo JRPG (aqueles RPGs de turno muito famosos na década de 90), em que os jogadores representam uma série de heróis, cada um com os seu talento e juntos precisam achar uma forma de derrotar esse poderoso inimigo.
Gostei da temática, existem muitas pessoas ainda fascinadas pelos JRPG da década de 90 (tanto que estão relançando o FF7) e traduzir isso pra um ambiente de Board Game é muito interessante, com muito espaço para explorar como Game Designer, visto que esses jogos já funcionam na estrutura de turnos e isso pode ser transposto muito para bem o tabuleiro. O tema de Jam “União” estava presente no jogo, pois todas as ações interagiam com outros heróis.
Jogamos em duas pessoas, cada um controlando dois heróis, na primeira rodada deixamos o boss no último terço de vida, tirando 20 mil de vida (dos 30 mil que ele tem), fazendo as próximas ações parecerem inúteis, porém mesmo assim acabamos perdendo, o boss deu 3 golpes seguidos de mil de dano em todos (o primeiro e +2) nos derrotando.
Acredito que o sistema de dados para os ataques do boss sejam uma boa ideia, isso mostra a aleatoriedade dos ataques dos inimigos, porém essa mecânica para as ações dos heróis faz com que o jogador não tenha um controle ou decisão real. Jogamos os dados e analisamos o resultado, então a única decisão que posso fazer é “rolo o dado novamente ou não?”, essa é uma decisão muito pequena e rasa, facilmente o jogador consegue calcular se vale o risco, analisando as possibilidades que tem de resultado.
Essa falta de decisão acaba distanciando jogo de um JRPG, onde a diversão é escolher a melhor combinação de ataques a cada rodada.
O fato de só um personagem (a Armista), causar dano, faz ela se tornar muito importante, tendo que defender ela a todo custo e, caso o jogador a perca a batalha acaba, pois nenhum outro personagem causa dano e assim fica impossível derrotar o boss.
Os JRPGs são cheios de golpes que matam na hora ou recomeçam uma batalha, porém em um jogo de tabuleiro, ter todo o seu esforço jogado fora por uma rolagem de dados ruim é muito frustrante, caso tivesse acontecido comigo eu iria ignorar essa rolagem e continuar jogando ou pior, desistido do jogo.
O jogo tem uma ótima temática, porém poucos espaços de decisões, abaixo segue algumas sugestões para aumentar esse espaço de decisão.
*DADOS, muitos dados!
Caso você queira manter o sistema de dados, uma sugestão seria cada herói rola 1 dado e depois rolamos 8 dados, agora, como uma equipe precisamos decidir quem vai pegar qual dado. Isso aumenta muito o espaço de decisão, pois um dado pode ser bom pra mais de um herói e dar um dado pra um significar não dar pra outro, forçando o jogador a fazer escolhas que envolvam sacrifícios.
*Armas pra todos os lados
Só a Armista dar dano é um problema que pode acabar com o jogo, uma solução simples é todos os heróis causarem dano de alguma forma.
*Escudos=curas
Efetivamente cura e escudo funcionam da mesma maneira, visto que o escudo dura até ser gasto, um jeito de resolver isso seria tornando o escudo BEM mais forte porém só dura esse turno, aí existe a decisão “quem quero tentar proteger nesse turno?” podendo arriscar perder uma boa habilidade.
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Sobre o manual:
O jogo usa uma combinação de dados para realizar as ações, “sequência”, “par”, “trinca”... porém no cartão dos heróis não está escrito qual a combinação necessária para cada ataque, optando por colocar imagens de dados para representar isso, porém uma imagem de 3 dados para representar qualquer “um par” não existe, precisaram colocar uma imagem de um par, nesse caso dois dados no número 4 e um no número 6, Isso gera a dúvida se é esse resultado exatamente que preciso tirar. Eu fiquei constantemente voltando para o manual para entender o que aquela seleção de dados queria dizer. Ter colocado em texto nas fichas evitaria essa confusão.
No setup existem algumas partes que não ficaram claras, o manual diz o seguinte: “cada jogador escolhe um personagem e se disponível, pega um dado para si”, o que fazer se não tiver um dado disponível? Na realidade, eu preciso de quantos dados? Com quantos heróis eu preciso jogar?
4º
Drunk Rangers
Game Designer: Br Jawa
O jogo é sobre Rangers já meio aposentados, meio enferrujados precisando voltar pro campo de batalha depois de muitos anos de bonanza, eles esqueceram como controlar o seu Zord e como luta. Os jogadores precisam se coordenar para derrotar os inimigos.
Eu adorei a temática, escolher uma temática que estamos muito familiarizados como os Super Sentais e virar ela de cabeça para baixo tornando os rangers irresponsáveis e perdidos é uma sacada incrível. A quebra de expectativa que isso gera é sensacional.
Algumas mecânicas como cantar “go go drunken rangers o ooo oooo ooooo” (não tinham os “o” nas regras, mas acho crucial pra uma música bem feita) me fizeram dar risada apenas de ler o manual, com o adendo incrível de “a última vez deve ser alta o suficiente pra ser levemente incômoda”. Ou a mecânica de gritar a peça que falta e jogar na mesa, parecem ser ferramentas de humor incrível.
Porém o jogo não gira em torno desses momentos, acredito que ele tenha potencial como um ótimo jogo de “pagar mico” com os amigos, onde o objetivo é dar risada como um grupo, então todo o jogo deveria ser em torno disso, monstros com nomes engraçados, peças de zord que não fazem sentido, tudo trabalhando em torno desses momentos engraçados com seus amigos.
Sobre a mecânica de batalha, efetivamente o jogo é sobre escolher a carta de maior número que tu tem disponível e jogar, não existindo um espaço de decisão interessante. Além disso, se todo Zord tem apenas 5 peças e a peça de valor mais alto é a cabeça que vale 4 o valor máximo de Zord na primeira rodada é de 20, e existem monstros de 25 e 30 que posso ter que lutar contra e não ter como vencer na primeira rodada.
Me parece um ótimo jogo para dar risada com os amigos, abaixo segue algumas sugestões:
*Muitos zords!
Acredito que criando mais bônus ou objetivos de Zord “O Atacante - faça um Zord com 3 pernas e ganhe +5 de bônus”, pode ser mais uma fonte de risada para o grupo. Além de uma decisão mais complexa do que “jogar a carta de maior número”.
*Menos papo mais ação
Esses jogos também ganham muito com um fator “pensar rápido”, um timer poderia ajudar nisso, forçando pessoas a cometerem mais erros e assim se divertindo mais com os infortúnios de “estar bêbado”.
*Deixa o povo falar
Acredito que a comunicação limitada não agrega ao jogo, na realidade sinto que me afasta da parte divertida que é dar risada com meus amigos, o jogo deveria forçar situações cômicas. Explico melhor os efeitos de uma comunicação limitada na avaliação do jogo Contingência.
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Sobre o manual:
Em cada folha A4 cabem exatamente 9 cartas 63mm x 88mm (tamanho poker size), recomendo sempre diagramar o manual assim.
3ºLucky Combat - Card Game
Game Designer: Theo Boechat
O jogo é uma batalha entre 2 jogadores em que cada um vai ter uma quantidade de ações que pode fazer em cada turno e com essas ações vai precisar escolher seus heróis e como atacar seu oponente.
Gosto muito de jogos que tenham mais de uma condição de vitória, cria um espaço pra diferentes táticas, porém a condição “derrotar 3 heróis” é muito mais alcançável do que “destruir as 2 bases”, tão mais fácil que não vejo o por quê de focar na base do oponente, visto que os heróis as protegem e os jogadores precisam derrotar os heróis que as protegem primeiro.
A mecânica principal de rolar um dado para determinar quantas ações o jogador vai poder fazer no turno é bem interessante, “ativar um novo herói ou atacar?” essa é uma decisão interessante, porém a partir do momento que você já tem 2 heróis (quantidade máxima) no campo de batalha as decisões acabam, a sua única escolha é com qual herói atacar e nesse caso vai ser sempre com o herói que pode causar mais dano. A escolha de em qual herói do inimigo você vai atacar também não é existente, visto que você sempre vai atacar o que conseguir matar nessa rodada.
Ao final da partida, quando ambos os jogadores estão com apenas um herói em campo o jogo se torna “quem rola o dado com o número mais alto”, pois o foco é derrotar o último herói e quem tiver uma rolagem mais alta primeiro ganha.
O jogo é super simples, porém a sua simplicidade acabou tomando conta de todas as decisões, segue algumas sugestões para o jogo:
*“1 de novo, não acredito!”
Os pontos de ação são uma mecânica muito legal, porém algumas regras para impedir uma maré de azar poderiam ajudar muito, como “caso não consiga fazer nada nesse turno, os pontos de ação se acumulam para o próximo”
*Cada um no seu quadrado
Cada herói possui algumas habilidades especiais além de vida e dano, “esse herói causa dano no herói e na base que ele defende” ou “esse herói pode atacar dois heróis simultaneamente”. Isso iria diferenciar cada herói além de criar um espaço de decisão sobre qual herói ativar e onde atacar.
*Pra que serve uma base?
No jogo as bases servem apenas como pontos de vida e uma condição de vitória que ninguém persegue, se cada base possuir um tipo de habilidade ou efeito especial, defender as bases ou escolher uma em relação a outra pode mudar todo o seu jogo.
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Sobre o manual:
Em cada folha A4 cabem exatamente 9 cartas 63mm x 88mm (tamanho poker size), recomendo sempre diagramar o manual assim. Se for usar um tamanho diferente da poker size que seja Euro, por ser menor.
Manual bem ilustrado e bem explicado, foi o manual que me deixou com o menor número de dúvidas, parabéns.